sábado, 16 de janeiro de 2010

Escravidão Humana

Gráfico da Escravidão

13/09/2009

Mais de 12 milhões de pessoas sofrem trabalhos forçados por não pagamento de dívidas

Ana G. Rojas e Lali Cambra Em Nova Déli e Cidade do Cabo

"Nasci escravo. Meu pai estava endividado com o dono de uma mina e forçavam toda a minha família a trabalhar 16 horas por dia, com pouca comida e bebendo água das poças formadas pela chuva." É a história de Lakshman Singh, um homem que passou seus primeiros 14 anos de vida sem saber que existia um mundo além da pedreira em que estava preso, a 40 km de Nova Déli, capital da Índia. Toda a família - os pais, três filhos e um tio - era submetida a trabalhos forçados por causa de uma dívida equivalente a 300 euros atuais.

ESPECIAL TRÁFICO HUMANO

Na Índia há milhões de pessoas presas nessa servidão por causa de dívidas, considerada uma forma de escravidão moderna. Embora os números variem muito, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 77% dos que servem por dívidas no mundo estão na Ásia e no Pacífico: 9,5 milhões dos 12,3 milhões totais, segundo os últimos dados de 2005, embora a própria OIT reconheça que precisam ser atualizados. As ONGs afirmam que pode haver muito mais escravos no mundo: "Nossas estimativas conservadoras indicam que hoje há 27 milhões, mais que nunca na história da humanidade", segundo um porta-voz da Free The Slaves [Libertem os Escravos], sediada nos EUA.O informe da OIT deste ano, "O custo da coação", publicado em maio passado, diz que as vítimas de trabalho forçado no mundo - excluindo as de exploração sexual - perdem cerca de 14 bilhões de euros em salários não recebidos. Com a crise econômica e financeira atual, a escravidão poderia aumentar, como temem os especialistas. "Se não forem tomadas medidas imediatas para aumentar a segurança dos trabalhadores vulneráveis, especialmente os que migram, há um grande risco de que mais pessoas caiam nessa situação", declara em uma entrevista por telefone Roger Plant, diretor do programa especial da OIT contra o trabalho forçado. Entre os grupos mais vulneráveis estão as crianças, ele diz. Até 50% dos que são explorados poderiam ser menores."A crise afeta os países em desenvolvimento devido à queda do comércio, preços de matérias-primas em baixa, menor acesso ao crédito, menor envio de dinheiro por familiares no estrangeiro, menor ajuda externa. Alguns países serão mais afetados que outros e em cada um a situação será diferente, mas em geral haverá maior vulnerabilidade. Por exemplo, as famílias não levarão as crianças ao colégio e as mandarão trabalhar, com o risco de que caiam nas mãos de traficantes ou formas de exploração laboral", explica Hans van de Glind, especialista em tráfico infantil da OIT."Não sabemos como a crise repercutirá em números", diz Peter Schatzer, diretor da Organização Internacional para Migrações (OIM) no Mediterrâneo, "mas já está afetando." Com um controle mais estrito das fronteiras, se prevê um aumento dos preços que as redes cobram dos imigrantes irregulares e um maior risco de tráfico humano. Na Índia, o país mais afetado, a escravidão se explica por um coquetel de fatores, entre eles a pobreza, a falta de educação e de conhecimento dos direitos, mas sobretudo a discriminação arraigada no sistema de castas, concordam os especialistas; 86% dos escravos pertencem aos "dalits" (antes chamados intocáveis), segundo a Frente para Libertação da Servidão por Dívidas. "As castas altas se aproveitam economicamente da crença de que alguns nasceram para ser explorados, enquanto as vítimas creem que é seu carma, que devem pagar por algo que fizeram em outra vida", explica Kailash Satyarthi, fundador da Bachpan Bachao Andolan (BBA), uma ONG que se dedica a libertar crianças escravas.Segundo suas estimativas, há cerca de 25 milhões de escravos só na Índia. Praticamente todos os que vivem nessas condições foram vítimas do tráfico humano ou adquiriram dívidas com seus patrões ou as herdaram de seus pais. Os trabalhadores mais pobres tomam um empréstimo adiantado do patrão para comprar ferramentas de trabalho ou remédios, comida ou roupa. Depois os salários são tão baixos e os juros, tão altos, que caem em uma espiral de dívidas. "Os empregadores mascaram uma prática fraudulenta na qual o trabalhador deixa de ter controle e se sente preso e sem possibilidade de reclamar seus direitos. Muitas vezes também sofrem ameaças físicas ou psicológicas", explica de Londres Enrique Restoy, da ONG Anti Slavery Internacional [Antiescravidão Internacional]. Em alguns casos as dívidas podem passar de geração em geração.O que se pode fazer para terminar com esse círculo vicioso? Os especialistas concordam que é necessário o pagamento de salários mínimos que garantam uma vida digna e a educação contra a discriminação e para conhecer os direitos. "Devem-se dar alternativas de crédito independentes", acrescenta Coen Kompier, especialista da OIT.Na Índia a situação melhorou, mas é difícil avançar mais rápido porque o governo não aceita falar do sistema de castas, e outros países não querem pressionar porque são seus aliados e consideram um país democrático, pró-ocidental, explica Restoy. Na África, ele acrescenta, a escravidão tem um caráter tradicional em países como Mauritânia, Níger, Chade e Sudão, ou se concentra nas crianças, por seu número ou por sua vulnerabilidade, "mas não se pode descartar que a escravidão por dívidas ocorra, por exemplo, em determinadas etnias indígenas marginalizadas".Calcula-se que no mundo existam 218 milhões de crianças trabalhando, de uma maneira ou de outra; 26% delas estão na África. Não se sabe quantas são submetidas a trabalhos forçados, mas foram identificados setores que usam crianças como escravos: mineração, agricultura e pesca. Desde 2002, a OIM libertou 618 crianças que trabalhavam forçosamente para comunidades pesqueiras do lago Volta em Gana. No caso de algumas meninas, a exploração é dupla: como criadas e como escravas sexuais.Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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