domingo, 31 de janeiro de 2010




Contemplando a maré baixa

nos mangues do Tijipió

lembro a baía de Dublin

que daqui já me lembrou.


Em meio à bacia negra

desta maré quando em cio,

eis a Albufera, Valência,

onde o Recife me surgiu.


As janelas do cais da Aurora,

olhos compridos, vadios,

incansáveis, como em Chelsea,

vêem rio substituir rio.


E essas várzeas de Tiuma

com seus estendais de cana

vêm devolver-me os trigais

de Guadalajara, Espanha.

Mas as lajes da cidade

não em devolvem só uma,

nem foi uma só cidade

que me lembrou destas ruas.


As cidades se parecem

nas pedras do calçamento

das ruas artérias regando

faces de vário cimento,


Por onde iguais procissões

do trabalho, sem andor,

vão levar o seu produto

aos mercados do suor.


Todas lembravam o Recife,

este em todas se situa,

em todas em que é um crime

para o povo estar na rua,


Em todas em que esse crime,

traço comum que surpreendo,

pôs nódoas de vida humana

nas pedras do pavimento.


João Cabral de Melo Neto
(Paisagens com figuras, 1954/1955)

sábado, 30 de janeiro de 2010

Tecendo a Manhã


Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

João Cabral de Melo Neto

Soneto da Busca


Soneto da Busca


Eu quase te busquei entre os bambus

para o encontro campestre de janeiro

porém, arisca que és, logo supus

que há muito já compunhas fevereiro


Dispersei-me na curva como a luz

do sol que agora estanca-se no outeiro

e assim também, meu sonho se reduz

de encontro ao obstáculo primeiro.


Avançada no tempo, te perdeste

sobre o verde capim, atrás do arbusto

que nasceu para esconder de mim teu busto.


Avançada no tempo, te esqueceste
como esqueço o caminho onde não vou

e a face que na rua não passou.

Poema extraído do livro A Vertigem Lúcida de Carlos Pena Filho

COTOVIA


Cotovia
— Alô, cotovia!

Aonde voaste,

Por onde andaste,

Que saudades me deixaste?


— Andei onde deu o vento.

Onde foi meu pensamento

Em sítios, que nunca viste,

De um país que não existe . . .

Voltei, te trouxe a alegria.


— Muito contas, cotovia!

E que outras terras distantes Visitaste?

Dize ao triste.


— Líbia ardente, Cítia fria, Europa, França, Bahia . . .


— E esqueceste Pernambuco, Distraída?


— Voei ao Recife, no Cais Pousei na Rua da Aurora.


— Aurora da minha vida Que os anos não trazem mais!


— Os anos não, nem os dias,

Que isso cabe às cotovias.

Meu bico é bem pequenino

Para o bem que é deste mundo:

Se enche com uma gota de água.

Mas sei torcer o destino,

Sei no espaço de um segundo

Limpar o pesar mais fundo.

Voei ao Recife, e dos longes Das distâncias, aonde alcança

Só a asa da cotovia,


— Do mais remoto e perempto Dos teus dias de criança

Te trouxe a extinta esperança,

Trouxe a perdida alegria.
(Manuel Bandeira)

Profissão de Fé


Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo,Talhar no mármore divino Com o camartelo. Que outro - não eu! - a pedra corte Para, brutal, Erguer de Atene o altivo porte Descomunal. Mais que esse vulto extraordinário, Que assombra a vista, Seduz-me um leve relicário De fino artista. Invejo o ourives quando escrevo:Imito o amor Com que ele, em ouro, o alto relevo Faz de uma flor. Imito-o. E, pois, nem de Carrara A pedra firo: O alvo cristal, a pedra rara, O ônix prefiro. Por isso, corre, por servir-me, Sobre o papel A pena, como em prata firme Corre o cinzel. Corre; desenha, enfeita a imagem, A idéia veste: Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem Azul-celeste. Torce, aprimora, alteia, lima A frase; e, enfim, No verso de ouro engasta a rima, Como um rubim. Quero que a estrofe cristalina, Dobrada ao jeito Do ourives, saia da oficina Sem um defeito: E que o lavor do verso, acaso, Por tão subtil,Possa o lavor lembrar de um vaso De Becerril. E horas sem conto passo, mudo, O olhar atento, A trabalhar, longe de tudo O pensamento. Porque o escrever - tanta perícia, Tanta requer, Que oficio tal... nem há notícia De outro qualquer. Assim procedo. Minha pena Segue esta norma, Por te servir, Deusa serena, Serena Forma!Deusa! A onda vil, que se avoluma De um torvo mar,Deixa-a crescer; e o lodo e a espuma Deixa-a rolar! Blasfemo> em grita surda e horrendo Ímpeto, o bando Venha dos bárbaros crescendo, Vociferando... Deixa-o: que venha e uivando passe - Bando feroz! Não se te mude a cor da face E o tom da voz! Olha-os somente, armada e pronta, Radiante e bela: E, ao braço o escudo> a raiva afronta Dessa procela!Este que à frente vem, e o todo Possui minaz De um vândalo ou de um visigodo, Cruel e audaz; Este, que, de entre os mais, o vulto Ferrenho alteia, E, em jato, expele o amargo insulto Que te enlameia: É em vão que as forças cansa, e â luta Se atira; é em vãoQue brande no ar a maça bruta A bruta mão.Não morrerás, Deusa sublime! Do trono egrégioAssistirás intacta ao crime Do sacrilégio. E, se morreres por ventura, Possa eu morrer Contigo, e a mesma noite escura Nos envolver!Ah! ver por terra, profanada, A ara partida E a Arte imortal aos pés calcada, Prostituída!... Ver derribar do eterno sólio O Belo, e o som Ouvir da queda do Acropólio, Do Partenon!... Sem sacerdote, a Crença morta Sentir, e o sustoVer, e o extermínio, entrando a porta Do templo augusto!...Ver esta língua, que cultivo, Sem ouropéis, Mirrada ao hálito nocivo Dos infiéis!... Não! Morra tudo que me é caro, Fique eu sozinho!Que não encontre um só amparo Em meu caminho!Que a minha dor nem a um amigo Inspire dó... Mas, ah! que eu fique só contigo, Contigo só!Vive! que eu viverei servindo Teu culto, e, obscuro,Tuas custódias esculpindo No ouro mais puro.Celebrarei o teu oficio No altar: porém, Se inda é pequeno o sacrifício, Morra eu também! Caia eu também, sem esperança, Porém tranqüilo,I nda, ao cair, vibrando a lança, Em prol do Estilo!
Olavo Bilac

Clarice Lispector


"Sou o que quero ser, porque possuo apenas uma vida e nela só tenho uma chance de fazer o que quero. Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce, dificuldades para fazê-la forte, tristeza para fazê-la humana e esperança suficiente para fazê-la feliz. As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas, elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos."

Clarice Lispector

Esperança


Esperança
Mário Quintana

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano,
Vive uma louca chamada Esperança,
E ela pensa que quando todas as sirenas,
Todas as buzinas,
Todos os reco-recos, tocarem
Atira-se,
E — ó delicioso vôo! Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada, Outra vez criança... E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes? E ela lhes dirá (É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...
Texto extraído do livro "Nova Antologia Poética", Editora Globo - São Paulo, 1998, pág. 118.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Resenha do Filme MATRIX


RESENHA DO FILME MATRIX
Século 20 e 21, seria real essa contemporaneidade?, o cotidiano, trabalhar?, estudar? Comer?, seguir regras de conduta e de convivência?, “seríamos um conjunto de indivíduos associados e seu sistema que forma ao se unir e que varia conforme a disposição na superfície do território, a natureza e o número das vias de comunicação e que constitui a base sobre a qual se estabelece a vida social?”, estaria certo Durkheim?; mas será que realmente nossas atividades diárias são reflexo do real? Ou será tudo ilusão? Essa primeira discussão do filme, o que é real? Ou o que é ilusão? É uma das bases do discurso do filme, o que é real? Ou que é ilusão? É uma das bases do discurso do filme, que retrata como seria viver num mundo criado pelas máquinas através de um programa chamado Matrix, que remonta com fidedignidade a realidade caótica de nosso século, onde o objetivo é manter a humanidade presa a essa enorme simulação; pois, para qualquer geração, a distinção entre o que é real e o que é apenas percebido como real é uma questão pertinente, tanto que já foi tratada por Confúcio, Platão (O mito das Cavernas) e Descartes (Quando penso sobre os meus sonhos claramente, vejo que nunca existem sinais certos pelos quais estar acordado pode se distinguir de estar dormindo. O resultado é que certos pelos quais estar acordado pode se distinguir de estar dormindo. O resultado é que fico tonto e esse sentimento só reforça a idéia de que eu posso estar sonhando); a segunda discussão do filme é a que os homens em guerra contra as máquinas com suas inteligências artificiais, bloqueiam a luz do sol, para que elas não obtivessem energia solar para sobreviverem, então, sem a energia solar como fonte de energia, tiveram que obter outra fonte, que por revés, tornaram-se sendo os próprios homens, onde através de casulos, homens e mulheres, nascem e morrem, servindo de fonte de energia às máquinas (sinergia – capacidade de várias mídias se alimentarem umas das outras) e sendo pacificados pela Matrix.
O personagem principal vivido pelo ator Keanu Reeves, interpreta o Neo, que trabalha numa empresa de softwere de dia, onde é programador, e também é um hacker conhecido no submundo, até que começa a ter contato com Morpheus (Morfeu tem a habilidade de assumir qualquer forma humana e aparecer nos sonhos das pessoas como se fosse a pessoa amada por aquele determinado indivíduo; curiosamente a droga morfina tem seu nome derivado de Morfeus, visto que ela propicia ao usuário sonolência e efeitos análogos aos sonhos), vivido pelo ator Laurence Fishburne, que vira uma espécie de guru e guia de Neo, o liberta oferecendo-lhe a pílula vermelha que o faz ver a verdade, uma analogia ao Mito da Caverna de Platão em a República cap.VII, por outro lado poderia tomar a pílula azul e continuaria manter-se na ilusão; junto ao Neo e ao Morpheus a Trinity (relativo a santíssima trindade, que no filme seriam: Neo, Morpheus e a própria Trinity), interpretada pela atriz Carie-Ann Moss, onde vive uma guerreira cujo o amor por Neo forma a rocha que dá força aos dois homens. O trio de guerreiros fazem a base do filme, que formam um movimento de resistência às máquinas, onde Neo faz uma espécie de salvador (Cristianismo), com uma habilidade de contornar e quebrar as regras da matrix , sendo capaz de libertar a humanidade do controle das máquinas, no entanto, as máquinas tem sua defesa, agentes virtuais capazes de defender a matrix dos invasores, agente principal dessa defesa é o agente Smith (nome comum nos USA, que no filme mais tarde será associado a um vírus), representado pelo ator Hugo Weaving, ele tem a missão de descobrir o código de localização de Zion, a última cidade humana existente, uma cidade onde a sociedade se formaria através de uma solidariedade orgânica. “um sistema de funções diferentes e especiais, que unem relações definidas, ou seja uma solidariedade produzida pela divisão do trabalho.”, assim definiria Duurkheim, essas funções de trabalho seria a base mantenedora de Zion, onde a consciência individual é subordinada a consciência coletiva. Essa cidade teria uma forma de dominação legítima, que seria legal pois assumiria um procedimento racional através de regras abstratas de caráter técnico ou normativo, e a justiça viria da aplicação dessas regras.
Uma terceira discussão do filme seria uma abordagem religiosa, “Os humanos eram ignorantes do que não podiam ver. Havia muitas ilusões, como se eles estivessem mergulhados no sono e se encontrassem em pesadelos, Eles estavam fugindo, perseguindo outros, envolvidos em ataques, caindo de lugares altos ou voando mesmo sem ter asas. Quando acordam, eles não vêem nada, Ao deixar a ignorância de lado, não estimam suas obras como coisas sólidas, mas as deixam para trás como um sonho.” Essas palavras poderiam muito bem ser ditas por Morpheus em um de seus discursos a Neo, mas na verdade são trechos do Evangelho da Verdade, um manuscrito do século 4 encontrado em 1945 em um jarro enterrado no Egito. Ele faz parte de um conjunto de manuscritos chamado Nag Hammadi, que descreve a crença dos gnósticos, um grupo de cristãos que viveu entre os séculos 2 e 5 e possuía suas próprias escrituras, crenças e rituais. “É a corrente cristã que mais se assemelha à Matrix. Eles acreditavam que nós iríamos acordar do mundo material e perceber que essa não era a realidade verdadeira”, afirma a professora de história da religião Frances Flanery Dailey, do Hendrix College, nos Estados Unidos . Não são poucas as referências que o filme faz ao cristianismo. Neo é tido como um messias e ressuscita no final do filme, Ele é amigo de Apoc (apocalipse) e Trinity (“trindade” em inglês). A última cidade humana, Zion, é uma referência a Sião, a antiga terra dos judeus, e a nave de Morpheus, Nabucodonosor, tem o nome do rei babilônico que aparece na Bíblia com um sonho enigmático que precisa ser decifrado. Nenhuma religião, no entanto, tem tantas semelhanças com o filme quanto o budismo. O principal ponto em comum é a idéia de samsara ou maya, segundo a qual nossas vidas são uma grande ilusão montada pelos nossos próprios desejos. É como se todo o mundo fosse, como diz Morpheus, “uma projeção mental da sua personalidade”, As pessoas estariam presas em um ciclo; elas tratam o que sentem como se fosse real e a ignorância de que aquilo é só uma ilusão as mantêm presas a esse mundo. Em uma das cenas do filme, Neo encontra uma criança com trajes de monge budista que entorta uma colher com a mente. O segredo, diz ela, é saber que a colher não existe. Uma vez superada a ilusão, atinge-se o nirvana, um estado que as palavras não podem descrever, em que a noção de indivíduo se perde. Um dos maiores reforços desse ciclo de ignorância é o fato de estarmos cercados de pessoas que também tratam ilusões como se fossem reais. “Essa idéia foi bem foi bem retratada no filme como uma rede de computadores que liga as percepções dos indivíduos, permitindo que um reforce no outro a ilusão de um mundo que não existe”, diz a historiadora Rachel Wagner, da Universidade de Iowa, que, assim como Frances, é autora de um texto comparado o filme às religiões. O caminho para a transcendência é a busca pessoal por iluminação, tanto para os budistas quanto para Morpheus, que afirma que “ninguém pode explicar o que é Matrix. Você precisa ser você mesmo”. Já Buda disse a seus seguidores: “Vocês próprios devem fazer o esforço; os que despertaram são apenas professores”, e a mesma explicação poderia vir de Morpheus: “Estou tentado libertar sua mente. Neo. Mas eu só posso lhe mostrar a porta.
O método dialético de Engels e Marx atentam para todas as formas de movimentos, inclusive as mudanças de estado, onde a dialética explica o movimento pela luta dos contrários, (o dominado sempre em conflito com o dominante), outro ponto é que em face da ação recíproca universal, onde as causas e efeitos se permitam continuamente: o que é efeito agora, ou aqui, passa a ser causa logo mais ou em outro lugar, e vice-versa. O marxismo diz que o desaparecimento do velho e o nascimento do novo são leis de desenvolvimento, então o mesmo ocorre na sociedade humana. Então seria certo afirmar que os homens na produção, com a intenção clara de produzir mais e gastar menos, possa ter dado a máquina o poder de pensar (artificialmente), onde num processo de resistência ao homem quiseram dominar a humanidade, onde à maquina deixaria de ser comandada pelo homem e passaria a controlá-lo. Porém, no filme Matrix, as máquinas tem um contexto dicotômico, ou seja, ela quer destruir o que seria a resistência, mas eles se utilizam delas pra proteger-se, sendo assim, sobreviveria o homem sem às máquinas?. Mas, esse processo de transformação não seria um processo qualitativo, como prediz a teoria Marxista e sim um processo evolucionista ou mesmo de transformação. Poderíamos usar essa teoria de transformação e utilizá-la como teorema em que Zion vence essa guerra, os humanos vencem às máquinas, seria a luta dos contrários onde essa mudança seria o benefício dos humanos, como por exemplo a capacidade de carregar informações diretamente do cérebro, além de vencer a guerra é claro, essa capacidade transformara o homem em metade máquina tendo conotações éticas e morais a serem discutidas, mesmo assim, teria uma questão de sobrevivência a ser discutida, se às máquinas elaborassem um programa capaz de controlar o homem metade máquina?, seria viável essa capacidade?.
O filme trouxe-me reflexões quanto a dependência do homem para com a máquina, será mesmo criada no futuro uma inteligência artificial capaz de revolta-se contra os homens, tem pesquisadores nessas áreas que afirmam existir essa possibilidade. Será?, bem, prefiro acreditar que não. Não dá para deixar de traçar um paralelo, caso tenha sido intencional ou inconsciente, por parte dos diretores, quanto o tal “conselho-mor” (Matrix Reloaded) fala da diferença entre às máquinas “do bem”, que fazem o serviço sujo para os humanos, e às máquinas “do mal”, que os querem destruir. Troque máquinas por imigrantes e norte americanos, e eis um retrato do atual estado das coisas nos EUA. Seria um exemplo?.

Por Flávio Fraga

sábado, 16 de janeiro de 2010

"Ghost-writers" das leis, consultores legislativos moldam maioria dos projetos do Congresso


Claudia AndradeDe Brasília


Os deputados e senadores levam a fama, mas a maioria dos projetos, relatórios e pronunciamentos apresentados no Congresso Nacional não são de autoria dos parlamentares nem de seus assessores diretos. No anonimato, uma equipe de servidores públicos concursados dedica-se a transformar em páginas e páginas de artigos e dados técnicos a idéia inicial do senador ou deputado. Mais do que atender os pedidos, os consultores orientam os parlamentares a respeito das demandas apresentadas. Desta forma, tornam-se formadores de opinião dos políticos.

Gustavo Taglialegna, um dos 147 consultores do Senado que atuam como "gost-writters" das leis. "Ghost-writers" das leis, os consultores legislativos são quase 350 na Câmara e no Senado. Estima-se que 9 em cada 10 projetos têm os dedos deles em sua elaboração. "O senador pode apresentar o projeto que ele quiser, até um para revogar a lei da gravidade. A gente faz, mas entrega junto uma nota técnica alertando que ele pode ser ridicularizado, que a comunidade científica provavelmente vai contestar, por se tratar de uma lei muito importante. Ele pode seguir nossa orientação e abandonar o projeto ou insistir e apresentar mesmo assim. Isso fica a cargo dele", ilustra o consultor-geral do Senado, Bruno Dantas.Os casos em que um projeto sofre alterações a partir das sugestões da consultoria legislativa são comuns. Dantas cita como exemplo a Lei de Falências, sancionada em fevereiro de 2005. "O projeto chegou bem cru pra gente. Um dos nossos melhores consultores analisou e argumentou com o senador Ramez Tebet (relator do projeto na Casa) que, do jeito que estava, a proposta não ia mudar nada, ia causar ainda mais confusão", conta o consultor-geral.Segundo ele, dos 100 artigos que compunham a matéria inicialmente, a consultoria chegou a 300 no substitutivo. "O difícil foi o senador convencer o líder do governo e o Ministério da Fazenda de que as mudanças eram necessárias. Porque, como o Senado é uma casa revisora, com as mudanças o projeto teve de voltar para a Câmara para ser votado mais uma vez, o que levou mais tempo. Mas o resultado foi uma lei bem mais completa", avalia. Ministro diz não ter lido plano de reforma política.
O ministro das Relações Institucionais, José Múcio, admitiu que não leu documento entregue ao presidente Lula na semana passada com as propostas do governo para a reforma política. O texto, divulgado pela Folha, cita a existe um "incentivo ao mercado partidário para manutenção das bases de coalizão". "Ninguém falou em um mercado partidário. A proposta não fala disso. É tudo um mal-entendido", insistiu Múcio.
O inverso também ocorre, quando um consultor não consegue convencer o parlamentar a incluir algum artigo que considera importante. Dantas cita um exemplo que ele mesmo vivenciou. "Eu achava que a Lei de Execução (que trata de ações de cobrança) podia ser mais audaciosa no sentido de proteger melhor o credor. Porque as leis sempre têm um viés mais para o devedor, que é tratado como coitadinho, o que nem sempre é verdade. Mas não consegui incluir algumas sugestões porque o senador disse que os acordos para a aprovação já tinham sido fechados e não tinha como fazer mudanças."Para o consultor-geral, é importante manter um certo distanciamento do trabalho. "O consultor não pode ter paixão pelos projetos. Mas é verdade que uma das coisas mais frustrantes é elaborar um discurso e não vê-lo pronunciado", admite. Gustavo Taglialegna é um dos 147 consultores do Senado. Ele trabalhou no projeto da Lei de Biossegurança e, a partir dele, desenvolveu tese de mestrado sobre a atuação de grupos de pressão na tramitação do projeto. "Mesmo a gente sendo 'ghost-writer' é gratificante ver uma lei sendo aprovada e saber que a gente teve uma participação ali", conta. Opiniões pessoaisSe a análise técnica permite intervenções do consultor, por meio de nota técnica anexada ao projeto, relatório ou pronunciamento, opiniões pessoais e ideologias políticas devem ficar fora do trabalho. "Não há nenhuma restrição ao consultor se filiar a um partido político. Ele só não pode transpor sua ideologia para o trabalho. Antes de voltar para o gabinete do senador, um projeto passa por quatro pessoas. Isso serve não apenas para identificar erros conceituais e de gramática como também para identificar qualquer intervenção ideológica, que não é tolerada", ressalta o consultor-geral. Por outro lado, a consultoria pode avaliar o efeito prático de uma idéia que tenha origem puramente política. "Muitas vezes um parlamentar representa um determinado grupo e sofre pressão para apresentar um determinado projeto, que não é viável. Nós preparamos o projeto, mas dizemos que ele tem tais e tais problemas. Normalmente o que acontece é que o senador cumpre seu papel, mostra o projeto e a nota para seus apoiadores e pergunta: 'e aí, vocês estão dispostos a enfrentar todos esses obstáculos?'", exemplifica.Na opinião de Bruno Dantas, sem o trabalho da consultoria, "o senador não tem condição de exercer o mandato". "Ele tem conhecimento em duas ou três áreas, mas é requisitado para tudo. Aí é que a gente entra", diz. PerfilPara atender aos 81 senadores, os 147 consultores se dividem em quatro grandes áreas de atuação: direito, economia, social e pronunciamentos, cada uma com subdivisões. Ao prestar concurso, o candidato já faz a opção pela área em que deseja atuar, o que não impede que médicos ou historiadores atuem na área de direito, por exemplo. A área social conta com antropólogos, educadores e sociólogos, entre outros. Em tempo: o salário de um consultor em início de carreira é de R$ 11 mil. O último concurso foi realizado em 2002 e o consultor-geral já aponta carência em algumas áreas. "O direito penal tem falta de consultor, porque tem muita CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), que tem apelo popular muito grande, e por isso os senadores sempre querem apresentar algum relatório ou projeto. A área de Minas e Energia, com o 'boom' do petróleo e do gás, também tem um volume muito grande de trabalho, para apenas dois consultores", cita. Como alguns dos integrantes da equipe já estão aptos a se aposentar, Dantas espera a realização de um novo concurso, ainda sem previsão para ocorrer. A equipe atual é formada em sua maioria por homens e a faixa etária vai de 28 a 68 anos. Consultoria externaA Câmara dos Deputados também possui um serviço de consultoria legislativa dedicado a elaborar projetos, relatórios e pronunciamentos para os parlamentares. A reportagem do UOL tentou falar com Ricardo Rodrigues, diretor do serviço de consultoria, que não quis dar entrevista.Uma reportagem publicada pelo jornal "Correio Braziliense" no início do mês apontou que das 1.429 proposições apresentadas entre fevereiro e junho deste ano, apenas 437 foram feitas pela equipe de 200 consultores da Câmara. Ou seja, em quase 70% dos casos, as consultorias externas foram privilegiadas. Neste caso, os deputados pagariam o serviço com a verba indenizatória de R$ 15 mil a que têm direito mensalmente.No Senado, o consultor-geral estima que "mais de 90%" dos projetos apresentados passem pela consultoria interna. Os demais ficariam a cargo dos assessores pessoais dos parlamentares ou de consultorias externas. "O problema é que a consultoria externa sempre tem lado. Nós não temos lado, porque não podemos ser mandados embora nem temos nosso salário reduzido", pondera.Bruno Dantas acredita que os consultores do Senado têm mais condições de atender aos pedidos, uma vez que a clientela para a qual prestam serviço é menor. "Mesmo se ele for do baixo clero, não tiver uma boa equipe de assessores com ele, a gente vai atender do mesmo jeito", afirma. No primeiro semestre deste ano, o setor recebeu quase 5.000 solicitações. Ao longo de todo o ano passado, foram 9.500. Na Câmara, a demanda dos 513 deputados pode atingir 28 mil solicitações por ano.

Uso de algemas


Súmula Vinculante 11, do Supremo, é inconstitucional, por Arryanne Queiroz. No julgamento do HC 91.952, em 7 de agosto de 2008, em oposição ao Superior Tribunal de Justiça e ao Ministério Público Federal, o Supremo Tribunal Federal anulou a sessão de julgamento do Tribunal do Júri que condenou um homem por homicídio triplamente qualificado, ao argumento de que a manutenção do réu algemado perante os jurados, a despeito das outras circunstâncias, influenciou na condenação, o que configuraria violação ao princípio da dignidade da pessoa humana.Desacertos à parte, como desdobramento disso, o STF editou a Súmula Vinculante 11, que transforma o uso das algemas em exceção não apenas no âmbito do tribunal do júri, como impõe a Lei 11.689/2008, mas também para a execução de ordens judiciais de prisão cautelar. O problema é que no aspecto formal e material, a Súmula Vinculante 11 é um sacrilégio contra a integridade da Constituição Federal de 1988.A edição da súmula não atendeu vários requisitos impostos pelo artigo 103-A da Constituição, sobre: 1) reiteradas decisões sobre matéria constitucional; 2) validade, interpretação e a eficácia de normas determinadas; 3) controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública; 4) grave insegurança jurídica; 5) relevante multiplicação de processo sobre questões idênticas.A súmula extrapolou os limites da decisão tomada no HC 91.952, pois não houve reiteradas decisões sobre matéria constitucional envolvendo uso de algemas, mas, somente, um julgamento isolado de um HC cujo objeto foi uma nulidade no âmbito de tribunal do júri. Nesse ponto, a falta de correlação entre o objeto do HC e o objeto da súmula é patente. Não bastasse, não houve ponderação pelo STF sobre validade, interpretação e eficácia de norma determinada, simplesmente porque a Lei 11.689/08, que talvez justificasse a edição, sequer havia entrado em vigor por ocasião do julgamento do HC.O objeto de discussão do HC é nulidade causada pelo uso de algemas em acusado em julgamento em plenário do júri. E isso é bastante diferente do uso de algemas em qualquer situação. Ou seja, uma súmula vinculante sobre algemas, nesse contexto, somente seria possível se versasse sobre nulidade pelo uso de algemas em júri. Afora isso, quem pesquisa a jurisprudência do STF não localiza os julgados que comprovam a existência de matéria controvertida. Isso porque o uso de algemas na execução de prisão cautelar nunca foi assunto controvertido nem mesmo periférico em processos criminais.Aliás, é preciso esforço para acreditar que existam milhares de processos nos tribunais cuja causa de pedir remota (o suporte fático do pedido deduzido em juízo) seja objetivamente o uso de algemas. A partir dessa constatação, cai por terra ilações sobre insegurança jurídica ou risco de relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.A prova de que o STF regulamentou a matéria, fazendo as vezes de Poder Legislativo — numa usurpação de competência sem precedentes que põe em risco o princípio dos freios e contrapesos —, é que a nova súmula impõe condições para o uso de algemas que nem mesmo a legislação ordinária faz. Apenas os artigos 474, §3º, do CPP e o 234, §1º, do CPPM versavam, antes da Lei 11.689/08, sobre algemas. Mas nenhum deles exige explicação por escrito para uso da algema. Ou seja, o STF inovou por via contestável.Além disso, a súmula alerta para a aplicação de penas diante do seu descumprimento. O nexo de causalidade para a aplicação da penalização civil, administrativa e penal reside na inobservância da súmula. O problema é que, segundo o princípio da legalidade, apenas lei ordinária pode criar crimes e preceitos secundários (penas). Afora isso, somente estatutos que disciplinam carreiras jurídicas podem prever hipóteses de incidência de pena disciplinar, sem mencionar que danos morais pelo uso de algemas não é dano in re ipsa — não dispensa prova.Nunca antes, na história do país, se viveu com tanta força o Estado Democrático de Direito. Mas ao descumprir todos os requisitos do artigo 103-A, o STF ameaça essa conquista do povo, que não deseja retroceder ao Estado Policial nem a nenhuma outra forma de hegemonia de poder.Sobre isso, aliás, vale registrar que não existe Estado Policial quando instituições como o Judiciário, o Ministério Público, o Legislativo, a OAB e a imprensa atuam com liberdade, autonomia e independência. Nesse debate sobre algemas, é preciso refletir sobre divulgação de imagens de presos — afinal, restrições já existem no ECA — e sobre a disposição do Legislativo para cumprir sua missão constitucional. Seja como for, se, por um lado, a preocupação do STF é legítima diante de eventuais abusos, por outro, isso jamais pode ser pretexto para a profanação da Constituição. Infelizmente, o STF não acertou desta vez.Revista Consultor Jurídico, 21 de agosto de 2008 Sobre o autor Arryanne Queiroz: é delegada de Polícia Federal, representante da Comissão de Prerrogativas da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) e membro do Conselho Consultivo do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.

Escravidão Humana

Gráfico da Escravidão

13/09/2009

Mais de 12 milhões de pessoas sofrem trabalhos forçados por não pagamento de dívidas

Ana G. Rojas e Lali Cambra Em Nova Déli e Cidade do Cabo

"Nasci escravo. Meu pai estava endividado com o dono de uma mina e forçavam toda a minha família a trabalhar 16 horas por dia, com pouca comida e bebendo água das poças formadas pela chuva." É a história de Lakshman Singh, um homem que passou seus primeiros 14 anos de vida sem saber que existia um mundo além da pedreira em que estava preso, a 40 km de Nova Déli, capital da Índia. Toda a família - os pais, três filhos e um tio - era submetida a trabalhos forçados por causa de uma dívida equivalente a 300 euros atuais.

ESPECIAL TRÁFICO HUMANO

Na Índia há milhões de pessoas presas nessa servidão por causa de dívidas, considerada uma forma de escravidão moderna. Embora os números variem muito, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 77% dos que servem por dívidas no mundo estão na Ásia e no Pacífico: 9,5 milhões dos 12,3 milhões totais, segundo os últimos dados de 2005, embora a própria OIT reconheça que precisam ser atualizados. As ONGs afirmam que pode haver muito mais escravos no mundo: "Nossas estimativas conservadoras indicam que hoje há 27 milhões, mais que nunca na história da humanidade", segundo um porta-voz da Free The Slaves [Libertem os Escravos], sediada nos EUA.O informe da OIT deste ano, "O custo da coação", publicado em maio passado, diz que as vítimas de trabalho forçado no mundo - excluindo as de exploração sexual - perdem cerca de 14 bilhões de euros em salários não recebidos. Com a crise econômica e financeira atual, a escravidão poderia aumentar, como temem os especialistas. "Se não forem tomadas medidas imediatas para aumentar a segurança dos trabalhadores vulneráveis, especialmente os que migram, há um grande risco de que mais pessoas caiam nessa situação", declara em uma entrevista por telefone Roger Plant, diretor do programa especial da OIT contra o trabalho forçado. Entre os grupos mais vulneráveis estão as crianças, ele diz. Até 50% dos que são explorados poderiam ser menores."A crise afeta os países em desenvolvimento devido à queda do comércio, preços de matérias-primas em baixa, menor acesso ao crédito, menor envio de dinheiro por familiares no estrangeiro, menor ajuda externa. Alguns países serão mais afetados que outros e em cada um a situação será diferente, mas em geral haverá maior vulnerabilidade. Por exemplo, as famílias não levarão as crianças ao colégio e as mandarão trabalhar, com o risco de que caiam nas mãos de traficantes ou formas de exploração laboral", explica Hans van de Glind, especialista em tráfico infantil da OIT."Não sabemos como a crise repercutirá em números", diz Peter Schatzer, diretor da Organização Internacional para Migrações (OIM) no Mediterrâneo, "mas já está afetando." Com um controle mais estrito das fronteiras, se prevê um aumento dos preços que as redes cobram dos imigrantes irregulares e um maior risco de tráfico humano. Na Índia, o país mais afetado, a escravidão se explica por um coquetel de fatores, entre eles a pobreza, a falta de educação e de conhecimento dos direitos, mas sobretudo a discriminação arraigada no sistema de castas, concordam os especialistas; 86% dos escravos pertencem aos "dalits" (antes chamados intocáveis), segundo a Frente para Libertação da Servidão por Dívidas. "As castas altas se aproveitam economicamente da crença de que alguns nasceram para ser explorados, enquanto as vítimas creem que é seu carma, que devem pagar por algo que fizeram em outra vida", explica Kailash Satyarthi, fundador da Bachpan Bachao Andolan (BBA), uma ONG que se dedica a libertar crianças escravas.Segundo suas estimativas, há cerca de 25 milhões de escravos só na Índia. Praticamente todos os que vivem nessas condições foram vítimas do tráfico humano ou adquiriram dívidas com seus patrões ou as herdaram de seus pais. Os trabalhadores mais pobres tomam um empréstimo adiantado do patrão para comprar ferramentas de trabalho ou remédios, comida ou roupa. Depois os salários são tão baixos e os juros, tão altos, que caem em uma espiral de dívidas. "Os empregadores mascaram uma prática fraudulenta na qual o trabalhador deixa de ter controle e se sente preso e sem possibilidade de reclamar seus direitos. Muitas vezes também sofrem ameaças físicas ou psicológicas", explica de Londres Enrique Restoy, da ONG Anti Slavery Internacional [Antiescravidão Internacional]. Em alguns casos as dívidas podem passar de geração em geração.O que se pode fazer para terminar com esse círculo vicioso? Os especialistas concordam que é necessário o pagamento de salários mínimos que garantam uma vida digna e a educação contra a discriminação e para conhecer os direitos. "Devem-se dar alternativas de crédito independentes", acrescenta Coen Kompier, especialista da OIT.Na Índia a situação melhorou, mas é difícil avançar mais rápido porque o governo não aceita falar do sistema de castas, e outros países não querem pressionar porque são seus aliados e consideram um país democrático, pró-ocidental, explica Restoy. Na África, ele acrescenta, a escravidão tem um caráter tradicional em países como Mauritânia, Níger, Chade e Sudão, ou se concentra nas crianças, por seu número ou por sua vulnerabilidade, "mas não se pode descartar que a escravidão por dívidas ocorra, por exemplo, em determinadas etnias indígenas marginalizadas".Calcula-se que no mundo existam 218 milhões de crianças trabalhando, de uma maneira ou de outra; 26% delas estão na África. Não se sabe quantas são submetidas a trabalhos forçados, mas foram identificados setores que usam crianças como escravos: mineração, agricultura e pesca. Desde 2002, a OIM libertou 618 crianças que trabalhavam forçosamente para comunidades pesqueiras do lago Volta em Gana. No caso de algumas meninas, a exploração é dupla: como criadas e como escravas sexuais.Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

"Navegar é preciso, viver não é preciso."

Fernando Pessoa

"Navegar é preciso; viver não é preciso." (*)

Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso. Cada vez mais ponho na essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade.
(texto do livro "Fernando Pessoa - Obra Poética")

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Resenha do filme A guerra do fogo


Antes de existir várias teorias a respeito da evolução, havia uma visão que predominava sobre a criação do homem: a hebraica cristã. O livro de gênesis relata:

Deus disse: “Façamos o homem a nossa imagem, como nossa semelhança, e que eles dominem sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra”. Livro da Gênesis, Bíblia.

Essa visão teocêntrica, criacionista, é carregada de dogmas, e tem a necessidade da fé para acreditar. O estudo dessa visão fica a caráter da teologia (Teologia, no sentido literal, é o estudo sobre Deus, theos, "Deus"; + logos, "palavra", por extensão, "estudo". Como ciência tem um objeto de estudo: Deus. Como não é possível estudar diretamente um objeto que não vemos e não tocamos, estuda-se Deus a partir da sua revelação. No Cristianismo isto se dá a partir da revelação de Deus na Bíblia. Por isso, também se define teologia como um falar a partir de Deus): Retratada por S.Agostinho em seu estudo sobre a teologia (teologia natural) : a cosmologia fala que, a matéria foi, a princípio, criada por Deus, que lhe depôs no seio os germes específicos de todos os seres. Estes germes, em condições favoráveis, desenvolvem-se na sua plenitude específica. A criação foi, pois, instantânea. A narração dos seis dias não implica distinção ou sucessão de tempo, mas apenas exposição doutrinal das diferenças espécies de criaturas dispostas segundo seis graus de perfeição. Deus não é o tempo, o qual é uma criatura de Deus: o tempo começa com a criação. Já em São Tomás de Aquino o homem surge da união da alma com o corpo; A alma, princípio imaterial, une-se ao corpo como a forma à matéria, o ato à potência, formando um composto substancial. Da alma recebe o corpo a existência, a vida e todas as outras perfeições. Do corpo recebe a alma, que é substância incompleta, o complemento natural de sua natureza e o material necessário ao pleno desenvolvimento de sua atividade. A natureza e a existência da alma foi tema de grandes discussões na época das grandes navegações, que, trouxe conseqüências nas culturas indígenas, pois, os colonizadores acreditavam que eles não a possuíam, eles eram animais, seres da floresta, um mero caminho entre a animalidade e a humanidade, levavam uma existência infeliz e miserável, eram preguiçosos, viviam com eterno pavor do sobrenatural, eram atrasados, estúpidos, de uma simplicidade brutal, eram movidos por uma criminalidade congênita, para dar-lhes uma alma era necessário catequizá-los. Depois da visão agostiniana e tomista, passa a ter a existência do homem um caráter reflexivo e racionalista com Descartes, criticista com Kant e histórica com Hegel, ele também dá ao homem negro um caráter de coisa, objeto de pouco valor.
Sendo a antropologia, (estuda o homem como espécie), uma ciência ocidental, tem por fundamento uma representação da concepção do homem sobre a perspectiva do ocidente, que possui forte influência do cristianismo, pela condição histórica da Igreja Católica. Como toda ciência, possui uma natureza zetética, tem seu objeto, método e aplicações, fugindo de conceitos e valores baseados no senso comum, pois podem acabar estabelecendo estereótipos, carregados de juízos de valor, criando até preconceitos. Cabe ao antropólogo se isentar dos valores produzidos, impostos ou condicionantes dos “aparelhos ideológicos do Estado”, Louis Althersser, seja ele, a igreja (religioso), a escola (educacional), jurídico, político, sindical (Estado) ou sua própria família (grupo ao qual pertence), para poder produzir ciência. Luiz Henrique Passador relata acerca do campo da antropologia:

O campo da antropologia: “... é na cultura ocidental que se constitui uma ciência que sistematiza as formas de conhecimento acerca das diferenças culturais. Portanto a antropologia é uma ciência ocidental e sua história resulta das experiências e interpretações históricas vividas e produzidas pelo ocidente”. Luiz Henrique Passador

Tendo como partida a ciência antropológica, o filme A Guerra do Fogo (La Guerre du feu, 81, FRA/CAN), de Jean Jacques Annaud, em quase duas horas de filme, consegue trazer uma narrativa da teoria da evolução humana. O filme se inicia há 80 mil anos atrás, na era cenozóica, período quaternário, época entre o Pleistoceno superior (150 mil anos) ao heloceno (10 mil anos), provavelmente no continente africano, com períodos de grande pluviosidade e vegetação rasteira (savanas), muitos dos animais foram extintos devido a mudanças climáticas, com períodos inter-glaciais a períodos de muita umidade, divisões tectônicas, havendo uma seleção natural dos animais que restaram (Teoria da seleção natural de Darwim, onde os mais fortes sobrevivem e os mais fracos perecem). No filme existe um grupo de ancestrais humanos que depende do fogo para proteção e aquecimento. Isso se caracteriza na primeira cena em que um grupo da família de hominídeos, gênero homo, espécie homo sapiens de Neanderthal, (Homo sapiens - homem sábio, homem racional), dorme numa caverna, seu habitat, todos juntos, enquanto alguns hominídeos machos ficam em volta da fogueira, se aquecendo e protegendo o grupo contra possíveis ataques de feras, retratado por lobos, e invasões de outros grupos. Características apresentadas pelo Homo Sapiens de Neanderthal: é relativamente pequeno, bípede, espinha dorsal curva (em forma de “S”), postura ereta, o ser humano apresenta locomoção bípede completa, este fato proporciona a utilização dos membros anteriores para a manipulação de objetos, por meio da oponibilidade dos polegares, possui crânio mesocéfalo, com cérebro volumoso, rosto proeminente a nariz largo e comprido, maxilar inferior largo, afundado e sem queixo, os homens de Neanderthal viviam em cavernas ou abrigos rochosos, usavam fogo para se aquecer, iluminar e cozinhar, a caça e coleta aram fontes de sua sobrevivência, aperfeiçoou as técnicas a os instrumentos, além da pedra lascada, fez uso intensivo de osso e madeira, era carnívoro e vegetariano, possuíam forma de linguagem, embora não houvesse grande número de sons, enterram seus mortos com todos seus pertences (elemento característico visto mais tarde pelas sociedades greco-romanas, “A Cidade Antiga, de Fustel de Coulanges”:

“Era costume, no fim da cerimônia fúnebre, chamar três vezes a alma do morto pelo nome do falecido, desejando-lhe vida feliz sobre a terra. Diziam-lhe três vezes: Passe bem. — E acrescentavam: Que a terra lhe seja leve— tanta era a certeza de que a criatura continuava a viver sobre a terra, conservando a sensação de bem- estar ou de sofrimento. No epitáfio declarava-se que o morto ali repousava, expressão que sobreviveu a essas crenças, e que de século em século chegou até nós. Nós usamos ainda este costume, embora ninguém hoje pense que um ser imortal possa repousar em um túmulo. Mas antigamente acreditava-se tão firmemente que ali vivia um homem, que nunca deixavam de enterrar junto com o corpo objetos que supunham ser-lhe necessários, como vestidos, vasos e armas. Derramavam-se vinho sobre o túmulo, para matar-lhe a sede; levavam-lhe alimentos, para saciar-lhe a fome. — Degolavam-se cavalos e escravos, pensando que essas criaturas, sepultadas juntamente com os mortos, prestar-lhes-iam serviços dentro do túmulo, como o haviam feito durante a vida.”). Fustel de Coulanges

O homem de Neanderthal desapareceu subitamente, por isso, é classificado como subespécie da espécie humana; determinarei o homem de Neanderthal como Grupo 1. O sexo entre esses hominídeos é realizado a base do instinto animal, a reprodução acontecia devido à necessidade desse instinto, mostrado no filme na cena em que a fêmea ao beber água no riacho é sucumbida ao desejo do macho, pois é esse o papel da fêmea, trocar sexo por subsistência, alimento. Em Seguida o Grupo 1 é atacado pelo que determinarei como Grupo 2, composto de pré-hominídeos (australopithecus) andavam lentamente, pareciam ter dificuldade em andar, se alimentava de sobras fáceis de carne, cena em que procuram sobras na fogueira, pois tinham dificuldade na caça, assemelham-se a macacos, corpo completamente coberto por pelos, ao contrário do Grupo 1, que se utiliza de peles de outros animais para aquecer-se; Esse ataque tem por objetivo o seqüestro das mulheres e alimentos. Após esse ataque o Grupo 1 se dispersa, onde um é atacado por lobos e o outro se isola numa ilha, onde os lobos não atravessavam por conta da água, lá eles se encontram, onde o fogo, armazenado numa espécie de lanterna, é apagado devido ao excesso de umidade, nesse trecho existe uma representação de reverência a um ancião, que seria chefe do Grupo 1, onde ordena que três dos hominídeos machos, pois as fêmeas não possuem valor, senão para o sexo, saiam à procura de fogo, pois não conseguiam produzi-lo, capturavam através de raios que atingiam as árvores, tem-se aí início do culto ao fogo, pois, além da dificuldade natural de se conseguir fogo, esse, o fogo, vinha dos céus. Dar-se início a jornada. È quando se começa a mostrar no filme a primeira relação de interação do meio-ambiente em relação a sobrevivência do homem, pois esse se utiliza do fator novo, para criar meios de sobreviver com a cooperação do meio em que vive (teoria sistêmica), é necessária criatividade para absorver e superar o novo. Em sua jornada em busca do fogo, encurralados por dentes de sabre, se alimentam das folhas da árvore em que se escondem, mostrando uma característica vegetariana, inovando para sobreviver, como também o filme mostra-os alimentando-se de ovos de pássaros, característica onívora. Mais adiante encontram um terceiro grupo que determinarei por Grupo 3, formados por Homo Eretus, características preponderantes: Rosto curvo, nariz chato, arcos superciliares bem marcados e abóboda craniana mais alta e larga, aparecem associados à pedra e armas, caçava e matava animais de grande portes (mamutes, rinocerontes, búfalos etc.), pode ter-se valido de tochas de fogo e armadilhas, para caçá-los; Inclusive na cena mostrada em que o Grupo 1 distrai os membros do Grupo 3 para roubar seu fogo, eles estão segurando imensos pedaços de ossos, parecidos com os do elefante (mamute), contudo apresentam uma característica distinta dos dois primeiros grupos, são canibais, se alimentam de carne humana, provavelmente por falta de carne eles adaptaram o seu gosto para sobreviverem. Nesse encontro com o Grupo 3 está preso para servir de alimento um casal com características próprias que determinarei por Grupo 4, Homo sapiens sapiens, que detém as seguintes propriedades: rosto reto, nariz desenvolvido mais fino, testa larga, mandíbula forte, estrutura robusta, esqueleto bem construído, possuía uma tecnologia material avançada, criativos intelectualmente, usavam a cerâmica, possuíam o poder da linguagem (“a linguagem é, com toda evidência, parte do patrimônio cultural de uma sociedade, é através dela que os indivíduos que compõem uma sociedade se expressam e expressam seus valores, suas preocupações, seus pensamentos. Por François Laplantine”), (“... não é a linguagem que é natural ao homem, mas a faculdade de construir uma língua, vale dizer: um sistema de signos distintos correspondentes a idéias distintas”, Ferdinand de Saussure); “Um sistema de comunicação, uma linguagem, foi paulatinamente elaborada. Ao longo do processo de evolução sobreviveram aqueles com maior capacidade de utilizar e desenvolver tais habilidades.” Silas Guerriero, enquanto os grupos anteriores se comunicavam basicamente por gestos, manuseavam ervas medicinais, fabricavam o fogo, possuíam ritos de acasalamento onde as mulheres gordas eram responsáveis pela procriação, por questão de sobrevivência e divindade, e construíam seu próprio habitat. Continuando no filme, o casal ao ver-se longe das atenções do Grupo 3, libertam-se, contudo só a fêmea segue viagem com o Grupo 1, interagindo com o trio, tentando comunicar-se. No percurso, cai casualmente um fruto ou pedra na cabeça num dos machos fazendo-a sorrir, eles olham o modo como reage e não compreendem essa expressão, pois, desconhecem o sorriso; Eles também não entendem porque ela os rechaça, com gritos, quanto a tentativa de se fazer sexo, pois, a única maneira que conhecem é a instintiva, diferente dela. O sexo no Grupo 4 é realizado com propriedades conceptivas, com posições sexuais apropriadas, distintas dos outros grupos. Seguindo viagem, com o fogo já conquistado, um dos machos neanderthal começa a se envolver afetivamente com a fêmea sapiens sapiens, criando um laço afetivo, fazendo com que ele depois da fuga da fêmea, inicie uma busca por ela, provocando estranhamento nos outros dois machos. Em sua busca ele encontra o restante dos membros do Grupo 4, sendo logo pressionado a copular com as mulheres, todas gordas, próprias para o acasalamento e concepção. O macho de Neanderthal começa a interagir com eles, sapiens sapiens, devido a essa interação, começa a observar toda relação do grupo com o seu meio, surge então o fato que mais o surpreendeu e o assustou, viu um dos homens ascender uma fogueira, criar fogo com suas próprias mãos, que para ele era até então divino, vindo dos céus. Seguindo sua viagem de volta para casa, com a mulher sapiens sapiens e o fogo, os três já apresentam características novas, como o sorriso, o afeto construído pelo macho em relação à mulher e um melhor convivência (aproveitamento) do meio ambiente em prol de sua sobrevivência (“... construção de uma melhor convivência com o meio ambiente.”, Silas Guerriero). Um característica mostrada no filme em que o Grupo dos Neanderthais aprenderam com os sapiens sapiens, foi na cena em enfrentam membros do mesmo grupo numa emboscada, vencendo a disputa pelo fogo, lanterna, com armas feitas com técnicas do Grupo 4, espécie de lanças feitas sem o uso do fogo. Ao chegar ao local onde o Grupo 1 habita, a felicidade com o fogo do restante do grupo, faz com que um deles apague-o despropositadamente, enfurecendo-os, porém o macho que tinha visto um dos membros do Grupo 4 ascender uma fogueira, criar fogo, tentou repetir o feito frustradamente, a mulher que os acompanhou, que conhecia a técnica tomou de suas mãos, fazendo ascender à fogueira, aos olhares atentos e admirados de todo o Grupo 1.
É certo que esses grupos, 1, 2, 3, 4, coabitaram no mesmo meio ambiente, sendo influenciados por ele, coexistindo em função do mesmo, utilizando-se dele para sobreviver, e com características diferentes. Eles resistiam em grupos às mudanças, fossem elas, climáticas, geológicas ou vegetativas, pois, só assim, sobreviveriam, no entanto, apenas o Grupo 4, Homo sapiens sapiens, sobreviveu no final, pois, era capaz de produzir cultura (“capacidade de raciocínio, abstração (seja o de criar idéias a arte), linguagem, construção e uso de ferramentas, postura ereta e plasticidade comportamental, entre outros.”; “...a cultura foi elemento importante na construção de uma convivência com o meio ambiente.”; “A capacidade de simbolização e criação cultural permitiu-nos constituir uma extraordinária característica: pensar no que não está presente, diante de nossos olhos. Essa capacidade de abstração e transcendência possibilitaram superar limitações impostas pela natureza.”, Silas Guerriero. O Homo Sapiens Sapiens deu origem a todas as sociedades modernas, diferenciadas apenas pela quantidade de melanina.
Um dos elementos introduzido no filme de Annoud, além da preocupação e transmitir com fidelidade como nossos ancestrais se comportavam, é o romance entre um macho da subespécie humana Homo de Neanderthal e a mulher da espécie Homo Sapiens Sapiens, essa interação fez com que, refletisse sobre o ponto de vista da antropologia psicológica (“... que consiste no estudo de processos e do funcionamento do psiquismo humano; é confrontado não a grupos sociais e sim a indivíduos. È a razão pela qual a dimensão psicológica é absolutamente indissociável do campo da antropologia, é parte integrante dele.” François Laplantine). A forma como o macho aos poucos vai percebendo a fêmea, construindo afeto, antes apenas influenciado pelo seu instinto, faz nos remeter a condição da natureza humana, onde por um lado Maquiável diz que: “o estado de natureza do homem é imutável, selvagem”, corroborado por Thomas Hobbes que expõe: “Homo Homini Lupus” (o homem é lobo do homem): o homem não é um ser naturalmente bom. São, na verdade, criaturas hostis e, sobretudo agressivas, movidas pó um instinto animal. Assim sendo, o outro é visto como objeto, seja ele de exploração da própria agressividade, de múltiplas formas de humilhação, e do sexo. A inclinação para agressão, detectada em nós mesmos e suposta no próximo, faz com que todos os nossos relacionamentos sejam sabotados. A sociedade, portanto, sob ameaça constante de ser desintegrada, já que o sentimento comum entre os seres humanos não é o bastante para conter as necessidades da natureza original agressiva. Essa condição muda com Rousseau que diz: “os homens vivem sadios, bons e felizes enquanto cuidam de sua própria sobrevivência”. August Comte, (pai do positivismo), posteriormente, pela perspectiva cognoscente, vai classificar a natureza do homem como selvagem, homem primitivo ou não evoluído, os homens adeptos as formas e práticas animistas, pois, não possuem a capacidade de produzir ciência. Charles Darwin por sua vez, utiliza-se da classificação comteana das formas de evolução do pensamento e aplica suas teorias biológicas ao entendimento das diferenças culturais, resultando no modelo teórico chamado de “darwinismo social”, esse modelo se torna questionável porque dá aspecto de supremacia entre as raças (etnias) e culturas sobre outras. Depois vieram outros teóricos, com outras teorias, que trataram de entender o estudo da cultura como objeto da antropologia, como: o relativismo cultural, funcionalismo, estruturalismo e a antropologia interpretativa ou interpretativismo.
O homem muda com as experiências absorvidas e sendo transformados pelo meio em que vivem, interagindo positivamente ou negativamente, como já vimos, nessas mudanças que ocorrem de acordo com a necessidade de um todo, porém pode partir do individual uma tomada de consciência que pode transformar toda uma sociedade, seja por idéias, arte, política e outros, inclusive alterando até a estrutura (meio) em que se vive. É desse ponto de partida que trago aqui essa vontade urgente de uma busca por um meio de coexistência entre os seres humanos e o meio ambiente, trazendo a tona essa problemática da necessidade ilimitada de consumo versus recursos escassos. Essa necessidade destrói inconseqüentemente o meio em que vivemos. Faltando um controle efetivo e políticas sérias que imponham coações eficazes em benefício de uma melhor qualidade de vida, visto que há uma relação latente de dependência entre humanos e o meio ambiente. Para que o futuro seja o retrato de uma sociedade ideal é preciso uma mudança, uma tomada de consciência coletiva, e urgente, pois já existem mudanças categóricas (alterações anormais no clima, vegetação, água, ar, entre outros) no sistema vivo que é nosso planeta. O autor Silas Guerriero retrata: “... o resultado da tendência inerente da vida para criar novidade, a qual pode ou não ser acompanhada de adaptações às condições ambientais em mudança. Daí decorre, inclusive, a possibilidade dessas transformações se darem em sentido negativo, comprometendo a sobrevivência da espécie.”. Continuaremos a cooperar e interagir de forma negativa, pondo em risco nosso espécie ?, Será o futuro da nossa humanidade, como espécie, seres geneticamente criados, melhorados e alterados em laboratório (eugênia) ?; Criará o homem uma forma de vida híbrida, superando nossa espécie ?. São discussões sérias em que a resposta está na forma de como lidamos com esses temas hoje. È urgente uma consciência ética, que provoque diretrizes que norteiem a conduta humana.
Flávio Fraga