sábado, 30 de janeiro de 2010

COTOVIA


Cotovia
— Alô, cotovia!

Aonde voaste,

Por onde andaste,

Que saudades me deixaste?


— Andei onde deu o vento.

Onde foi meu pensamento

Em sítios, que nunca viste,

De um país que não existe . . .

Voltei, te trouxe a alegria.


— Muito contas, cotovia!

E que outras terras distantes Visitaste?

Dize ao triste.


— Líbia ardente, Cítia fria, Europa, França, Bahia . . .


— E esqueceste Pernambuco, Distraída?


— Voei ao Recife, no Cais Pousei na Rua da Aurora.


— Aurora da minha vida Que os anos não trazem mais!


— Os anos não, nem os dias,

Que isso cabe às cotovias.

Meu bico é bem pequenino

Para o bem que é deste mundo:

Se enche com uma gota de água.

Mas sei torcer o destino,

Sei no espaço de um segundo

Limpar o pesar mais fundo.

Voei ao Recife, e dos longes Das distâncias, aonde alcança

Só a asa da cotovia,


— Do mais remoto e perempto Dos teus dias de criança

Te trouxe a extinta esperança,

Trouxe a perdida alegria.
(Manuel Bandeira)

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